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Guiana, o país que ganhou a megasena

Logo ali, do lado de Roraima, vizinho do Brasil, a Guiana vem se preparando para começar a receber o prêmio de uma espécie de megasena de natal que ganhou. Tendo como capital Georgetown, e como fronteira Brasil, Venezuela e Suriname, com um PIB per capta inferior a US$ 6 mil, e próximo de 800 mil habitantes, prepara-se para começar a explorar através de uma parceria entre a Exxon, Hess e CNOOC, uma das maiores descobertas de petróleo em águas profundas do mundo. Do dia para a noite, os ganhos do petróleo totalizarão mais de 40% da economia do pequeno país, e, neste ano de 2020, tem um crescimento estimado de 86% – 10 vezes mais o que a China cresceu em seus melhores anos. Ou, tinha… E assim, a vida, os interesses, os costumes começaram a passar por mudanças radicais. A riqueza simplesmente incendiou as eleições de meses atrás e rachaduras irremediáveis hoje marcam as relações entre políticos de diferentes matizes. No frigir dos ovos, ou, no balanço final exclusivamente sob a ótica econômica, e para entendermos a dimensão da conquista potencial da Guiana, é suficiente atentarmos para o fato que tem ao lado o país com as maiores reservas de petróleo do mundo a Venezuela, mas que por gestão criminosa e medíocre, encontra-se mergulhada na miséria. Hoje, a Venezuela, com 26 milhões de habitantes, produz 700 mil barris por dia. A Guiana, com 800 mil habitantes, já produz 100 mil barris por dia. E, até o final desta década, a produção de petróleo da Guiana será maior que a da Venezuela, 1,2 milhão de barris por dia. Assim, começaram infinitas obras a todo vapor em Georgetown para atender os novos habitantes, funcionários das petroleiras e de parceiros e fornecedores. Um novíssimo shopping center, com um Hard Rock Café, 12 cinemas, mas construção de prédios residenciais a toque de caixa. Mais ou menos o que aconteceu com a vizinha Venezuela, décadas atrás. Que um dia figurava no ranking dos quatro países mais ricos do mundo, que até hoje tem mais petróleo que a Arábia Saudita, e encontra-se falida e na miséria. Desde o ano de 2015, mais de 3 milhões de venezuelanos jogaram a toalha e desistiram de seu país. 100 mil deles vivem hoje no Brasil. E a expectativa é de que até o final de 2020 o número total de venezuelanos que desistiram de seu país chegue a 5 milhões. E aí entra o que se converteu em livro e continua na pauta dos estudiosos sobre descobertas de riquezas, A Maldição do Petróleo. Desde a descoberta de reservas monumentais de petróleo na Venezuela, 1922, o país converteu-se num dos mais comentados ringues de brigas entre diferentes facções políticas de todos os gêneros, espécies, crenças e ideologias. No ano de 1973, e após o primeiro choque do petróleo, a Venezuela optou por nacionalizar todas as petrolíferas que trabalhavam no país, concentrando toda a exploração na estatal PDVSA. Com a concentração da riqueza nas mãos do estado – 96% das exportações da Venezuela são de petróleo – políticos incompetentes e corruptos como Chávez e Maduro deitaram e rolaram. E passaram a estatizar praticamente toda a economia, comprando bancos, siderúrgicas, indústrias e fábricas de todos os setores de atividade, dando fim à concorrência e tornando os profissionais que permaneceram em funcionários do estado. Em paralelo, e com a estatização, a eficácia da gestão pública foi mergulhando em direção a zero, a produção despencou de 3,2 milhões de barris por dia para 1,5 milhões, e no meio do caminho o preço do barril de petróleo que chegou a bater nos áureos tempos de 2014, US$ 103, caiu para US$ 35,7, e até dias atrás encontra-se próximo dos US$ 50. Em síntese, a Venezuela afundou na incompetência, corrupção e estupidez de seus governantes. No livro A Maldição do Petróleo, de 2012, Michael Ross, autor, começa o prefácio, alertando, “Quem sonha em ganhar na loteria ou encontrar um tesouro enterrado acredita que um grande lucro inesperado vai tornar sua vida melhor. Para muitos países em desenvolvimento, porém, a descoberta de recursos naturais valiosos pode ter consequências estranhas e, às vezes, até mesmo politicamente prejudiciais”. Este livro, diz seu autor, explica as origens e a natureza dessa Maldição, e como pode ser sanada. E no capítulo um, O Paradoxo da Riqueza das Nações, abre com duas citações. A primeira de Juan Pablo Pérez Alfonso, ex-Ministro do Petróleo da Venezuela, que desacorçoado diante do que aconteceu com seu país depois das descobertas do petróleo, disse, “O petróleo é o excremento do diabo. Estamos afogados no excremento do diabo…”. E a segunda, do Rei Idris da Líbia, ao receber a notícia que um consórcio americano que prospectava petróleo em seu país tinha, finalmente, encontrado muito petróleo… Com a expressão indisfarçavelmente contrariada e triste, vaticinou, “Gostaria que tivessem encontrado água”. Assim, e nos próximos anos, acompanharemos se, verdadeiramente, a maldição do petróleo é uma realidade, e como se comportará nosso vizinho, Guiana, diante da ótima ou péssima notícia que fará com que seja o país de maior crescimento econômico em um único ano e de todos os tempos. A mega crise que eclodiu no início do ano, em função da disputa Rússia e Arábia Saudita, jogando os preços do petróleo para baixo, não paralisam os planos da Guiana e muito menos o sonho de seus habitantes. E nem mesmo, e, por enquanto, o Coronavírus… Todos acreditam que essas duas crises encontrarão uma solução no máximo até o final do ano. Que a maldição do petróleo, do ouro negro, não se abata sobre a Guiana, e seus habitantes. Que a alegria não se converta em miséria e tristeza